Conto de natal
os-nossos-contos-de-natal-2024
Com tanto atraso, mas lá vai o meu conto de natal:
Em Setembro, antes da escola começar, o meu filho veio a correr para casa contar-me que a casinha abandonada, ao fundo da rua, mesmo ao lado do parque infantil, afinal tinha dono: era um senhor rabugento, velho e barrigudo.
Não dei atenção até no início de Dezembro ter-me cruzado com um senhor e depressa o miúdo me relembrou a história da casinha abandonada.
Contou-me que ele estava sempre a reclamar do barulho que fazem no parque e que já perderam umas bolas de futebol no quintal dele, mas ele recusou-se a entregar!
Aquela história não me era estranha...
Hoje, enquanto arrumavamos os restos do papel de embrulho, encontrámos um baralhado de cartas uno.
O miúdo ficou radiante gritando que foi o Pai Natal quem deixou o presente. Já eu e a mãe dele não conseguimos lembrar de quem poderia ter oferecido aquilo, e como nos escapou na hora de abrir os presentes.
De repente, veio-me à memória o vizinho que tinha-mos na rua que morava com os meus pais durante a minha infância.
Era um homem velho, resmungão que não gostava de crianças e odiava o natal.
A casa dele era pequena, mal cuidada e situada perto da praceta onde as crianças se juntavam para brincar.
Ele distrui-a todos os brinquedos que escapassem para o seu pequeno quintal. Reclamava do barulho das nossas brincadeiras e deixava a casa sempre, duas semanas antes do Natal.
Dizia que não suportava as decorações e os cânticos de natal que se espalhavam pela rua e por isso ia de férias para outro lado.
Os mais velhos falavam que ele deveria ter perdido a família e por isso esta data o incomodava tanto. Também apontavam essa razão para justificar a sua amargura.
Mas na verdade nunca ninguém lhe conhera família, já era um velho quando apareceu na rua.
A minha mãe de quando em vez fazia umas bolachas e mandava-me entrega-las.
Num desses dias encontrei a porta aberta e entrei.
No hall de entrada, pendurado ao lado dos casacos estava o fato de pai natal. E umas botas iguais às do pai natal, estavam encostadas à porta.
Ele apareceu nas minhas costas, chamou-me mal educado e intruso, pegou a bolachinhas e ameaçou que iria falar com a minha mãe por eu ter invadido a casa dele.
Passou a ser ainda mais desagradável com todos, até que um dia desapareceu.
Quando percebemos que ele tinha ido embora, saltamos o muro para explorar o terreno e tentar recuperar alguns dos nossos brinquedos.
Todos os brinquedos estavam devidamente preservados num pequeno anexo. Aí eu tive a certeza de que ele era mesmo o Pai Natal disfarçado.
Quando contei tudo à minha mãe ela riu. Disse que provavelmente ele trabalhava como pai natal nas zonas comerciais e por isso é que saia de casa nessa altura. Que ela tinha a certeza que ele era só um velhinho solitário e sem paciência, amargurado pela vida, mas de bom coração. Era mais uma das muitas pessoas que a sociedade aprendera a não ver.
Foi recordando as palavras da minha mãe que decidi pegar alguma comida e alguma da roupa dos presentes de natal que seria para trocar no dia 26 e fui bater na casa daquele senhor.
Ele abriu, de semblante fechado! Desejei um bom natal, ofereci o que lhe levava e um leve sorriso foi desenhado no seu rosto. Depressa reclamou que não precisava de nada, mas que não faria a desfeita de rejeitar o presente! Desejou-me um bom natal e fechou a porta na minha cara!
Registei mentalmente que uma vez por mês trarei alguma coisa para ele, e farei-me acompanhar pelo meu pequeno. Talvez ele até goste de jogar uno!
Lembrei me da minha crença sobre o velhinho da minha rua.
Tenho a certeza que a minha mãe tinha razão e que, também, este velhinho é mais um dos muitos que se tornaram invisíveis para a sociedade, mas... e se ele também for um informante do Pai Natal?